Segundo o ex-ministro da Comunicação Social do MPLA, João Melo, a imprensa pública, em Angola, estava obrigada a continuar a desempenhar um papel preponderante durante as próximas décadas. Isto queria dizer que durante as próximas décadas (certamente, como nos últimos 44 anos, sob a égide do MPLA) Angola não será uma verdadeira democracia e um Estado de Direito.
Por Orlando Castro
O também “jornalista” e escritor (segundo a Angop, note-se) discursava no Encontro das Empresas Públicas de Comunicação Social da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), organizado pela Direcção Geral de Informação e pela Rádio Televisão de Cabo Verde.
No encontro, esteve igualmente integrada uma conferência sobre a auto-regulamentação da imprensa pública (propriedade do Estado, entenda-se), dedicada ao tema “Importância e limites da Auto-Regulação nos Média Públicos: Equilibrar Direitos e Responsabilidades no contexto da pós-moralidade”.
João Melo justificou a sua previsão com o facto de o empresariado local ser ainda “débil”, apesar de a legislação do sector, aprovada em 2017, ter acabado com todos os monopólios na área de comunicação social. Em Angola, o Estado/MPLA é proprietário assumido dos principais órgãos de comunicação social e, de forma encapotada, de muitos outros. Se isto não é monopólio e concorrência desleal, então acreditemos que os jacarés voam ou que, desde 26 de Setembro de 2017, são vegetarianos.
Dizia João Melo, com inequívoco conhecimento de causa e da casa, que salvo uma ou outra excepção, um crescimento exponencial da imprensa privada é uma miragem. E é mesmo. Num país que tem 20 milhões de pobres para uma população de cerca de 29 milhões, que futuro terão todas as actividade que não estejam nas mãos do MPLA? Num país que, desde a independência em 1975, conheceu um só partido a governar e que teve, durante 38 anos, o mesmo presidente (nunca nominalmente eleito), que futuro terão todos aqueles que pensam de forma diferente do MPLA?
Relatou a Angop que, numa outra direcção e a título de balanço, o governante disse que, em menos de um ano de governação do presidente João Lourenço, “todos os órgãos públicos não são apenas líderes de audiência em Angola, como contribuíram – além dos actos do próprio Presidente da República, nomeadamente para o combate à corrupção – para a rápida e inequívoca mudança de reputação do país, quer nacional quer internacional”.
Essa de falar de liderança de audiências, bem como do contributo para melhorar a reputação do país, era mais uma tentativa de João Melo colocar as suas teses no pódio do anedotário nacional. Estava no bom caminho e lá chegaria não fosse agora atraiçoado por João Lourenço, e a grande distância dos seus mais directos “adversários”, Luvualu de Carvalho, Bento Kangamba e Adelino de Almeida.
O ex-ministro da Comunicação Social reiterou, na sua comunicação, que o objectivo do sector que dirigia era fazer da comunicação social do regime “não apenas os de maior alcance em termos de expansão e audiência, mas, sobretudo, os mais sérios e credíveis do mercado”.
João de Melo ia, aliás, levar a carta a Garcia. Não que os órgãos do MPLA algum dia sejam os mais sérios e credíveis do mercado. Mas porque, seja por obra e graça do Ministério da Comunicação Social ou da sucursal do MPLA para o sector, a ERCA, Angola tenderá a só ter órgãos do Estado e, portanto, sem concorrência. Aliás é a mesma estratégia seguida pela “democracia made in MPLA”: ter vários partidos mas só um único partido para governar.
“Hoje, a perspectiva é converter os órgãos tutelados pelo Estado em genuínos órgãos públicos, abertos a todos, dando espaço e voz aos diferentes segmentos da sociedade, proporcionando o debate plural e contraditório, etc.”, sublinhou o ex-ministro, certamente convicto de que somos todos matumbos ou simples clones dos dirigentes do MPLA (e do Governo) que – com raras excepções – para contarem até 12 têm de se descalçar.
Como a audiência não era a habitual (caninos autómatos do regime), João Melo apercebeu-se que nem todos estavam a ser ludibriados, por isso sentiu necessidade de maquilhar o seu totalitarismo dizendo que a imprensa pública não deve ser confundida como um mero instrumento do governo. Apesar dessa tentativa, não resistiu a dizer (conforme ordens superiores) que a Imprensa também não pode ser (ora aí está!) anti-governamental.
João Melo, importa reconhecer e relembrar, é alguém que com uma rara perspicácia faz a simbiose perfeita entre um sipaio da era colonial (ao estilo de José Ribeiro) e um mercenário da era marxista do MPLA (tipo Artur Queiroz).
Num artigo publicado no dia 5 de Agosto de 2015 no Jornal de Notícias (Portugal), escreveu que “a prisão, em Luanda, de 15 activistas acusados de prepararem uma sublevação popular de atentado ao Presidente da República está a ser usada como pretexto para reviver, sobretudo em Portugal, as velhas campanhas anti-MPLA do período da guerra civil em Angola, quando a UNITA pagava o salário de numerosos jornalistas, políticos e outras figuras portuguesas, que adoravam as visitas à Jamba”.
João Melo, na velha tradição dogmática do seu partido, reeditava velhas teses, segundo as regras – não menos dogmáticas – do seu “Jornal de Angola” (JA), desde sempre órgão oficial do MPLA, correia de transmissão do regime ditatorial que (des)governa Angola desde 1975.
De facto, no dia 12 de Maio de 2008, o Pravda (como é também conhecido o JA) ameaçou divulgar “as listas dos nomes dos quadrilheiros portugueses capturadas no bunker de Jonas Savimbi no Andulo”. Até hoje não o fez. E também, e mais uma vez, João Melo falou da questão mas não deu o nome aos bois. É pena. Mas pode ser que o seu sucessor, “Nuno Carnaval”, o faça.
Então, camarada João Melo, como mais vale tarde do que nunca e agora que deixou de ser ministro, não será esta a melhor altura para divulgar essa lista de “jornalistas, políticos e outras figuras portuguesas”? Não será altura de pôr tudo em pratos limpos?
Continuamos à espera das listas de quadrilheiros portugueses e, já agora, também da imensa listagem dos oficiais das FAPLA e depois das FAA que trabalhavam para Savimbi, assim como dos políticos do MPLA, alguns com altos cargos nos diferentes governos e que também eram assalariados do líder da UNITA, e ainda dos jornalistas (portugueses e angolanos), alguns hoje “ERCAmente” rendidos aos encantos do MPLA, e que também eram amamentados por Savimbi.
Há já muito tempo que o povo angolano vem assistindo ao gingar bamboleante e demagogo de João Melo, uma espécie de Goebbels do MPLA que João Lourenço tanto gosta de ver dançar ao ritmo da sua batuta, vomitando raios e coriscos contra todos os que não servos e escravos do seu patrão.
Este tipo de fuga, ou cobardia psicológica, (agressão deslocada, como explica a psicologia), acontece porque ele tenta, sem sucesso, disfarçar os sofismas e as ambiguidades e contradições do MPLA que parasitam a sociedade angolana, económica e socialmente há 44 anos.